Oi. Se você ainda não ouviu o primeiro episódio de Tramas Coloniais, a gente recomenda que você ouça antes de mergulhar aqui no material de apoio – só para evitar spoilers. Se você já ouviu, vem se aprofundar nos temas e conhecer alguns bastidores da produção.
A ideia do episódio é apresentar o podcast e começar a responder a uma pergunta complicada, que vai aparecer em todo o podcast: o que é colonialismo? A Raquel Sirotti e a Gabriela Montoni contam como a colonização começou e se manifestou na África. Para ajudar nesse caminho, o fio condutor da história é algo bem familiar: o jogo de tabuleiro. Desde os jogos usados pelos europeus no século 19 para espalhar a ideologia colonizadora, até um jogo africano com uma visão contra-colonial baseada na lógica de semeadura e colheita.
Os jogos, além de servirem como fontes históricas e ferramentas ideológicas, se ligam diretamente à noção de colonialismo. Eles criam mundos e territórios fictícios. Tanto no jogo quanto no colonialismo, existem regras, peças e jogadores que tentam dominar o espaço. As regras já vêm prontas, mas tudo depende de como os jogadores as interpretam, além de um toque de sorte ou azar. As peças são os jogadores ou suas coisas, e isso pode mudar conforme as negociações e estratégias, mas também pela força — seja econômica, militar, legal ou cultural. Os jogadores são os que têm, ou querem ter, poder sobre esse espaço. O grupo pode ser mais ou menos uniforme, dependendo do jogo e do seu objetivo. Ganhar ou perder, embora motive o jogo, é só um jeito de alcançar interesses e reforçar valores.
O episódio começa com alemães jogando, bebendo e se divertindo em 1885. Mas o som que você ouve, claro, não foi gravado no fim do século 19. A Raquel fez a gravação num bar de jogos em Frankfurt. E o jogo que estava na mesa era esse:
Há 140 anos, o objetivo da brincadeira era bem diferente. O Jogo de Camarões, citado na cena de abertura, tinha como missão fazer os colonizados africanos serem gentis com os colonizadores europeus. As cartas tinham essas ilustrações caricatas de camaroneses.
O episódio também cita o Jogo das Colônias Alemãs, lançado em 1890 como “uma viagem de alegria e descoberta pelas colônias”:
Na parte final do episódio, o contraponto africano: a Raquel e o moçambicano Mauro Manhanguele, que também participou das pesquisas do podcast, visitam a Feira de Artesanato, Flores e Gastronomia de Maputo (Feima). Ali eles são convidados a jogar o Mancala, um jogo milenar africano baseado na cooperação mútua – em Moçambique ele é chamado de Ntxuva.
Além dos jogos de tabuleiro, o episódio também menciona uma caricatura francesa publicada no jornal L’Illustration em 1885, que representa a chamada “partilha da África”:
E dois áudios que talvez você queira ouvir na íntegra ou ver os vídeos:
O discurso de Samora Machel proclamando a independência de Moçambique em 25 de junho de 1975.
A conferência na USP com participação de Nego Bispo em 13 de março de 2023.
Por fim, se você quiser se aprofundar ainda mais no tema do episódio, seguem algumas referências bibliográficas que serviram de base para a nossa pesquisa:
– “A invenção da África: Gnose, filosofia e a ordem do conhecimento”, de Valentin Yves Mudimbe (2013).
– “Colonialidade do poder, Eurocentrismo e América Latina”, de Anibal Quijano (2005).
– Artigo de Sarah Zabrodski sobre o Jogo das Colônias Alemãs (2016).
– “Discurso sobre o colonialismo”, de Aimé Cesaire (1978).
– “Pele Negra, máscaras brancas”, de Frantz Fanon (2008).
– “Raising Germans in the Age of Empire: youth and colonial culture, 1871-1914”, de Jeff Bowersox (2013)
– “Colonialism/postcolonialism. Vol. 178”, de Ania Loomba (1998).
– “The Metamorphoses of Middlemen: The Duala, Europeans, and the Cameroon Hinterland”, de Ralph Austen em “The International Journal of African Historical Studies 16, no. 1” (1983).
– “Postcolonial and decolonial dialogues”, de Gurminder K. Bhambra, em “Postcolonial studies 17, no. 2” (2014).
– “Colonizing bodies and minds: gender and colonialism. The Invention of Women: making an African sense of western gender discourse, de Oyèronké Oyewùmi” (1997).